sexta-feira, 28 de outubro de 2016

POESIA - AQUELA LÁGRIMA - THIAGO LUCARINI

Aquela lágrima
Se agarrou aos meus cílios
Como uma última oração.

O que ela diz?
O que ela diz?
Desistiu do céu por mim.

Ficou ali naquelas nuvens negras dos olhos
Suspensa no tempo por toda uma eternidade,
Um cristal de prece eterna aos velhos anjos bons.

O que ela diz?
O que ela diz?
Desistiu do céu por mim.

Para sempre, será ali, nos cílios
O clamor ao céu bendito e distante,
Uma lágrima coagulada de amor

Que se negou a cair de mim.
Eu, anjo caído, sigo sozinho, esperando
A hora, de juntos, regressarmos ao eterno azul.

O que ela diz?
O que ela diz?
Desistiu do céu por mim.

25/10/2016.

POESIA - A NUVEM QUE SOU - THIAGO LUCARINI

Gotas de chuva
Na nuvem que sou
Insistentemente se anunciam

Marejando meu horizonte,
Mergulhando meus olhos
Molhando a terra aos meus pés.

Um leito líquido se estende
No limiar das pálpebras e cílios
Vem temporal por aí, e vem rápido,

Pois gotas de chuva
Na nuvem que sou
Insistentemente se anunciam.

Sou céu seu sentimental.
Molhado úmido líquido desfeito.
Chovendo chorando sonhando secar.

POESIA - TULIPAS VERMELHAS - THIAGO LUCARINI

Ainda fico da varanda na cadeira de balanço
Observado a função dos pequenos corações

Do meu agitado, versal e pulsante jardim.
Meus corações assimétricos nãos são as rosas,

Mas as formosas e ardentes tulipas vermelhas,
Que latentes desabrocham silenciosas no bater

Do meu coração no balanço da cadeira velha.
As criaturas puras fazem passeata diante delas,

Belas tulipas vermelhas de dor, sabor e amor,
As quais, eu também vejo da aberta janela da alma.

O crepúsculo chega e o dia em vermelho se encerra
No jardim, entretanto, pulsam as resistentes tulipas

Sempre vermelhas jamais se põem abaixo da terra,
Na noite fechada e escura são o motor das ocasiões  

Como enigmáticos corações cálidos e rubros, fazendo
Ergue-se a vida tanto no dia leve quanto na noite lúdica.

15/07/2016.

POESIA - A FACE NO ESPELHO - THIAGO LUCARINI

Pela primeira vez
Olhei no espelho
E vi tantas coisas quebradas

E estupidamente não era eu.
Palavras, palavras quebradas
Amontoavam-se na minha cara amassada.

Tantas palavras tão doces, embargadas,
Afogadas na garganta flutuam à margem da pele.
Reconheci amor, amizade, felicidade, tempo.

Um pouco mais fundo da derme, numa análise,
Vi como pontas de facas em riste: dor, morte, medo
Eram estas palavras de pontas afiadas que quebravam todo o resto.

Comportavam-se como icebergs neste mar de linhas do rosto,
Frias espinhas cortantes, expostas no tempo-espaço do desespero.
Pela primeira vez olhei-me no espelho e não gostei do que vi

Palavras quebradas afundavam em mim, sem flores para velar
A delicadeza de outrora, em liquidez rompiam o reflexo indo morar
No avesso perfeito. Olhei no espelho, ele frio, riu de mim, de mim.

POESIA - FARSA POÉTICA - THIAGO LUCARINI

Teu rebuscamento excessivo
Causa as tuas palavras
Um frio obsoleto e duro.

No comercial puritano
Perdes a tua alma de verve e mote
E a poesia desce ladeira abaixo,

Talvez, uma gota de promiscuidade
Sarasse este frio de falsos ornamentos postos.
A perfeição é status do que está parado.

A estética dependerá de alguns trincados,
De algumas pontas ascendentes e descendentes,
Pois senão, construiremos apenas linhas e não palavras.

A imortalidade é fixada em atos puros,
Por atos e palavras que falam por si só.
O domínio tenciona demasiadamente as rédeas já rígidas

Levando-as a se quebrarem, liberando no ar
O perfume das flores cadavéricas no armário.
Continuo a repetir sempre que: o poleiro limpo

Demais é sinal de que o passarinho muito, mas muito
Sabidamente está cagando fora de casa, do ninho, da moral.
E merda acumulada por mais distante que esteja, uma hora, fede.

POESIA - DAMA DA NOITE (SEIO DE MULHER) - THIAGO LUCARINI

A lembrança é no amor a cadeia mais pura.
Manuel Bandeira

Encerramento poético do dia
Ela veio, santa, imaculada
E despiu-se diante de mim na noite
Uma flor de candura bendita,
Pele branca, perfumada e lisa.

Enroscou teu pudor ao meu,
Corpos sedentos e molhados.
Eu fascinado coloquei teu seio rosado
Na boca, ela gemeu, enquanto
Acariciei teu vale de lírios ardentes.
Nos incendiamos na volúpia, mas também em amor.

Marte e Vênus.
Mágica da devoção carnal,
Enlevo dos sexos soberanos
Entrega sublime sem negação
Pertencentes unicamente ao gozo.

Sua língua de prazeres atrevida
Riscou meu corpo acendendo a chama proibida.
Bebi do seu néctar de mulher,
Enquanto os lírios se alimentavam
Do leite da criação original e perfeita
Seiva distinta da fêmea do Paraíso.

Mulher, dama da noite, feminina
Mina de tesouros, perfume do êxtase,
Pétalas de sensualidade voluntária.
Consome-me sem piedade até as cinzas
Antes do alvorecer, pois
Toda mulher no final da noite
Vira eterna flor.

POESIA - FILHO DO PARAÍSO - THIAGO LUCARINI

FOTO: Mariana Xavier

Olhar para o céu e não achar significado
Nas estrelas, no cosmo, no alinhamento da vida

É um enorme pecado, pior ainda, é olhar para o alto
E não ter empatia, necessidade de santidade vivida.

Ó Senhor tende piedade deste pecador em oração,
Dê-me razão, sentido, objetivo, direção, vocação.

Qualquer coisa para eu desafogar meu duro coração.
Quero achar o caminho da retidão, da bondade, descarregar

Meu fardo de falhas nos confins do esquecimento
E assim ser nova criatura no orvalho da alva prometida.

Anseio deixar para trás este passado de incredulidade e erros,
E ser um alguém capaz de crer, de germinar a semente da fé,

Dei o primeiro passo ó Senhor, reconheça a vontade em mim,
E faça-me mudar a velha casca para tornar-me um filho do Paraíso.

Atenda ao meu apelo, Glorioso Pai, estenda-me tuas mãos de aceitação
E livrai-me da vergonha, da morte inútil e do inferno de não ser santo.  

POESIA - OLHAR ROUBADO - THIAGO LUCARINI

As rendas alvas que cerram
Teus olhos velados e calmos

Embalam todo o azul de um céu que caiu.
Pedaço por pedaço se desfez todo o horizonte,

Todo o inescrutável limiar do teu olhar único.
Repousas tua cabeça serenamente em descanso.

Ninguém percebe que tuas janelas foram costuradas,
Seladas para não revelar o frio lago opaco, que agora

Reside atrás destas persianas pestanas portas fechadas.
A renda é só mais um enfeite posto para desviar a atenção.

Sorte tem a morte que guarda teu sincero olhar
Aí, do outro lado do véu, do além, tão longe de mim.

POESIA - PRÓLOGO DA VIDA - THIAGO LUCARINI

A gravidez é o prólogo de toda a vida,
Período de encenação da formação única

Do ser humano que viverá entre nós.
Todos os componentes visam o bebê,

Esta explosão galáctica, de gênese criativa,
O milagre da existência criando uma estrelinha

Dentro do universo do bendito corpo feminino.
Depois de pronto o fruto do útero, é hora de nascer,

Sai a criatura divina, signo de inocência e cuidado,
E no mundo aqui de fora vira o sol de vários caminhos.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

POESIA - CAMILA - THIAGO LUCARINI



Teu corpo magro, diáfano
É sinal da sua intransigência velada.
Lembre-se: seus óculos não são escudos
Mais do que consertar, eles embaçam a tua visão.
Magra, magra, magra
Camila, a sábia inquestionável
Discordo, discordo.”
Um sorriso gentil, mas por trás sempre um
Discordo, vigoroso discordo.

Pequena mulher poética e romântica,
Sem ser poetisa, coisinha pouco vivida
Tens a alma gentil e inocente,
Não há pecado algum nisto.
Todavia, a vida é dura!
Nem tudo tem razão ou é
Como queremos que seja.

Nenhum autor vivo ou morto
Pode explicar a vida, sequer a religião facetada
E isso não é ateísmo da minha parte.
Por isso, um conselho gasto:
“Venda um tanto de Discordos vagos.
Salve o seu trêmulo coração.”

Apesar de pequena e magra
A vida tratará de lhe ensinar
As feridas e espinhos deste caminho dos viventes.
Ela não tem dó de ninguém,
Muito menos dos pensadores
(Muito menos dos pensadores)
Creio que serás um tanto mais sábia
Não que sejas tola, longe disso, Camila.

Mas alcançará de fato iluminância
Só depois de ter sua psicologia quebrada
E lhe for injetada uma dose de realidade crua.
Só assim, possivelmente aceitarás amargamente
Que nem tudo, nem todos têm salvação.

Como eu, alheio.
Como ele, com ela.
Como ela, com ele.
Como Deus, sozinho.

Camila veemente grita:
“Discordo!”

POESIA - ANJOS BÊBADOS - THIAGO LUCARINI



Cantarolantes anjos bêbados
Do prístino néctar da glória

Caminham sorridentes e felizes
Pelas alfombras macias do Céu

Embebidos em açúcares idílicos,
Uma poesia ascendente dos véus.

Boêmios de paz guerrilheira,
Auréola de amiga santidade,

Mirra, fumaça doce, velas, incensos,
As linhas da lira do fadário dos anjos.

Asas iridescentes, de pôr do sol.
Bêbados anjos caminham abraçados

Soluçam bênçãos anônimas
Exalam proteção para os inocentes.

Mãos em prece, ao alto, anjos de assalto
O gozo, o dobro do júbilo celeste,

Um retrato sacro pintado no fremer
Dos pilares de toda a existência pura.

É festa no firmamento divino
Ante a chegada de boas almas.