sexta-feira, 19 de junho de 2015

POESIA - COISA DE MENINO - THIAGO LUCARINI


Nenhum menino é inocente. 
Pode até ser ingênuo, mas inocente
Jamais.
Aquele menino em específico
Ficou mau logo cedo (como todo menino).
Sozinho em seu quarto
Descobriu uma roliça, tímida e rosada lagartixa
Sempre exposta à parede do corpo,
Da qual rapidamente ficou íntimo.
A criatura branca, sempre escondida
O intrigava. Eles brincavam se cutucavam
A lagartixa eriçada, de vez em quando (sempre)
Levantava sua cabeça curiosa do esconderijo avaliando seu amigo e o mundo desconhecido. 

Mas o menino ruim de espírito
Descobriu prazeres inconfessos, toda vez
Que se sentia nervoso, injuriado
Procurava sua amiga lagartixa,
Tocava-a, alisava, acariciava a hirta lagartixa
Ela recebia a tudo silenciosamente, ás vezes, o menino
Chegava a tal ponto de machucá-la
Expondo seu êxtase, pobrezinha, essa nada dizia, nunca.
Depois dos abusos inúmeros do menino
Ela voltava para sua casa e dormia escorregadia, esperando novo amor
Ou surra. Apesar de tudo eram inseparáveis.
Aquela fora uma época de grandes descobertas.

O menino cresceu, tornou-se homem
E a lagartixa, bem, continuou lagartixa, contudo mais experiente
Ela achou doce prazer em sua silente (e não mais tortura) diária. 
Calejada ao final de cada ciclo de missão cumprida
Cuspia um rio de brancas palavras não ditas
A escorrer na mão do menino-homem fascinado.
Ambos cúmplices, donos de uma amizade verdadeira
Esperavam ansiosos o carinho mútuo produzido
No silêncio da cumplicidade que somente um homem e sua lagartixa podem ter.

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