sexta-feira, 12 de agosto de 2016

POESIA - OS CORVOS DO MEIO-DIA - THIAGO LUCARINI

O sol encerrou

Seu expediente
Ao meio-dia.
O mundo cobriu-se
De luto, mas não era
O luto das tempestades.
Toda a luz fora encoberta
Por uma revoada de corvos
Crocitantes, de negro arauto.
A Terra coalhava-se de mortos.
Tudo era caos e pestilência
Aos poucos vivos, penitência.
O ar pesado e tóxico corrói.
Desce pelos pulmões fracos
Feito arame farpado, rasgando.
Àqueles que vivem de morte
Apogeu, festim e boa sorte.
Os corvos do meio-dia crocitam
Coisas ruins espreitam
Roendo os nós dos fios de seda
Que sustentam a frágil vida.
As flores apodrecidas
Formam um mar de lama
Incolor, sem estética e fétido.
Só os perniciosos carniceiros reinam.
Os outros pássaros, agora são
Almas a cantarem da sepultura acústica.
Moscas em alegre passeata ideológica
Zumbem rindo da vida já passada
Zumbem sem tino sua piada escatológica.
As covas são as únicas
Portas abertas e as lápides
Os únicos endereços eternos.
Sonhos vencidos de rigor mortis
Espocam como bolhas sulfurosas
Expelindo imortais pesadelos.

O céu de escarro verga-se inflamado
Sustentando todos os horrores irreais,
Saudoso do límpido azul de outrora.
De olhos inchados e purulentos,
Um corvo bicando sua cabeça ferida,
Chora o fim da vida, a morte desempregada
Lamentando o tolo engano dos corvos e das moscas,
Pois assim que todo corpo (vivo ou morto) secar
Todos eles passarão: corvos, moscas e morte.

10/08/2016.

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