segunda-feira, 27 de março de 2017

POESIA - A VÉSPERA DAS VESPAS E DAS PERAS - THIAGO LUCARINI



Elas sabiam pelo tremor dos ferrões
Que o amanhã seria o derradeiro dia.

Não teriam gordos insetos por sobremesa,
Mas densas peras sobre a polida mesa.

Quem mandou fazerem ninho
Tão perto dos homens mesquinhos.

De véspera sabem que amanhã é tormento,
Perderam a última chance de irem para longe.

Muitas vespas vésperes radiantes de negror
Preferiram enforcar-se no arco-íris múltiplo.

A fruta pode até ser doce, mas o açúcar
É flagelo para as vespas, é pífio castigo.

E dolorosamente todo o vespeiro sabe de véspera
O horror frutuoso que as espera nas peras amarelas.

POESIA - A ELEITA - THIAGO LUCARINI



A flor alva,
Ousada e límpida

Arreganhava seu perfume,
Expondo sua essência vernal.

Flores mais recatadas,
Vermelhas e sensatas

Ficavam escandalizadas,
Preferiam segredar tal odor.

Já a alva flor, a eleita
Dos meus olhos e nariz

Não se prendia ao pudor
Das tímidas pétalas ou ao

Escândalo da carne alheia.
Não se importava com os espinhos

Que lhe atiravam. Tinha um escudo
De verdade vulgata.  Irremediável

Seu perfume rouba o fascínio de vidas.
Alva flor escolha dos meus sentires básicos.

TAUTOGRAMA - MÉDIO MEDIANO - THIAGO LUCARINI



Memórias mal metabolizadas
Maldito médio mediano morno
Mereceu morrer minguando,
Martelando misérias, mascando
Mínimas migalhas, mão magna
Mostra, mistifica meias metades.
Mediano mudo máximo manipulável,
Microscópico minimalista mental.
Melodia midiática maquinista, mesquinha,
Mecanismo mirabolante, massacrante.
Médio mediano mistura mundos murchos,
Melancolias, máculas, miragens, mesmices.
Médio mediano monstro macro montado,
Mercado mercenário, meritocrático,
Mutila multidões, mesmeriza
Muitos milhares movendo milhões,
Mostrando mercadoria maravilha,
Mentindo, minimizando, marcando
Mentes merda, medíocres, mortas.

POESIA - DEBANDADA DAS CORES - THIAGO LUCARINI



Meu jardim empalideceu
Debandada das cores flácidas.

Quando abro a janela do quarto
Vejo apenas velhas feridas ácidas,

Antigas flores sem cores ou amores
Restam de pé apenas contornos vazios.

Já não posso usar a distração furta-cor
Para minha dor nem perfume para auxílio.

Sumiram as borboletas, as abelhas, parte de mim.
Meu jardim sem cor está inseto de qualquer esplendor.

Autoritário ingrato, meu jardim foi gaiola para as flores
Na primeira chance fugiram me deixando aos meus horrores.

POESIA - DESTROÇOS DOS OLHOS - THIAGO LUCARINI



Dos olhos que naufragam
Não há destroços que se salvam.

Alguns cílios são desprendidas balsas
Nas lágrimas que descem sem valsas.

Além disso, os restos perdidos
Rumam à alma de sonhos feridos

Vão ao profundo ingrato de mim
Buscando atravessar o limiar do fim

Tentando cair pelo libertador precipício
E achar bem longe, à deriva, novo início.