quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

POESIA - LARANJAS - THIAGO LUCARINI

Somos laranjas.
Vamos removendo a casca,
Expondo a polpa e segredos
Intrínsecos a carne e no sumo.
Deixando algumas feridas,
Partes perdidas
Na busca de algo melhor.
Tudo é para o consumo,
E no fim, somos nudez e bagaço.

domingo, 25 de fevereiro de 2018

CRÔNICA - MADURO ANTES DO TEMPO - THIAGO LUCARINI

Sou cansado de muitas maneiras. Não é preguiça, que fique claro. Dizem que me falta paixão, me sobra desilusões, que sou jovem demais para todo este desânimo e apatia. Sinto-me podre, desconectado na maioria dos dias destes meus vinte e poucos anos, como se a felicidade fosse pertencente a todos ao meu redor e tangencial ao eu, se porventura, tenho um dia alegre, estranho. Gostaria de saber o que os mais velhos que eu fazem, que se apresentam tão bem, plenos e inteiros em si. Não é falta de realizações, considero que tenho minha cota de conquistas, talvez, eu pense além do necessário, isso, pode ser um mal, analisar a vida friamente, sem apreciar certas futilidades e inconstâncias. Pior é que sou assim desde sempre, meio azedo com tudo. Invejo aqueles leves de alma, sempre sorridentes, amigos de todos, quando eu duvido de tudo e principalmente de mim. Talvez me falte Deus, amor, grata ilusão.
Nunca me achei no frescor da jovialidade, sempre fui maduro demais para a minha idade, conversava com os distantes, ignorava os iguais. Pouca paciência ao despropósito. Certamente, este me foi o grande defeito dado: estar maduro, pronto (se é que isso existe) antes do tempo. Meu olhar é feito de pesos, de medidas, de ponderações tantas, de controle absurdo. A linearidade me queima a alma. Ser inconsequente me é fascínio longínquo. Não bebo nem me drogo, para não abrir mão dos limites da tensão, apesar de, por vezes, parecer-me encantadoramente tentador. Por um dia, queria me desligar, achar esse desprendimento, ou no futuro, ser um estranho Benjamin Button e encontrar a liberdade e aliviar o ranço, quando, enfim, de fato, estiver velho.

sábado, 24 de fevereiro de 2018

POESIA - SINTOMA ILUSÓRIO - THIAGO LUCARINI

Tem algo de impuro
Em quem promete
Certezas a uma vida inteira.
Somos instáveis e volúveis,
Pois temos ânsia pelo novo
E por reinvenções tantas.  
Só há a certeza do provisório.
Momentâneo não é algo mal
Para sempre é sintoma ilusório,
Uma vez que não existe
Vontade que bem se fixe
Na eterna demência dos dias
Neste incerto tempo passageiro.

domingo, 18 de fevereiro de 2018

POESIA - METRO QUADRADO - THIAGO LUCARINI

Muitos oferecem amor escravo,
Preso a correntes e repressão.
Só conhecem apertadas celas
Espaço por metro quadrado
E quando o prumo do açoite falta
Perdem a noção, pois são
Guiados por medo e opressão.
Em cárcere não há nobre quilate
Sem dó arranque no toco os dedos
Daqueles que ousarem te podar.

POESIA - PROFILÁTICO - THIAGO LUCARINI

Permita-se quebrar-se, chorar,
Sofrer, berrar, errar, fazer cagada,
Dar murro em ponta de faca.
Somente assim, adquirirá anticorpos
Contra burrices futuras próprias
Ou más intenções alheias.
Antes doer profilaticamente
Algumas poucas vezes
A ser trouxa uma vida inteira.

sábado, 17 de fevereiro de 2018

POESIA - FLORES NO FURACÃO - THIAGO LUCARINI

Algumas flores confundem
O abuso indolente do furacão
Com implacável e estrondoso amor.
Esquecem-se do prazer de uma brisa,
Da sutileza dos ventos do fim de tarde
Ou mesmo da estabilidade atemporal
De um dia sem qualquer movimentação.
O erro aqui é crer no exagero, na rotação
De distorção que faz o coração das flores
Aceitarem a dor como símile ao amor.

POESIA - FRASCO DE APARÊNCIAS - THIAGO LUCARINI

Para ter excelso perfume,
Cego, macerei minhas flores
Ignorando suas súplicas de ficar.
Quão obscuro foi-me achar
Um quintal pelado, sem jardim,
A pele vermelha exposta à ausência.
Agora me resta o perfume fraco
Condensado num frasco de aparências
E nenhum motivo para perfumar.

POESIA - ATOLEIRO - THIAGO LUCARINI

De repente, todo o caminho
Perde o sentido de horizonte.
Não há vaga-lumes para guiar-me,
Amor para esperar, alegria a vir,
Estrelas reconfortantes a brilhar.
Tão somente pedras espalham-se
Diante dos meus pés escuros.
Choro sobre as pedras na esperança
Que derretam e virem frágil lama
Para assim, eu atravessar sem feridas
O mole atoleiro equivalente de mim.

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

POESIA - HIPERBÓLICO - THIAGO LUCARINI

Tenho um coração hiperbólico
E o seu exagero me condena
A achar no olhar vestígios irreais.
Vejo-me envolto nos teus braços
Morando no infinito dos teus lábios
Sendo de relevância ao teu coração
Sendo mais que uma presença esperada
Sendo meu nome tua palavra especial,
Porém feito de hipérbole nada aqui é real.

POESIA - OLHOS LIMPOS - THIAGO LUCARINI

Estou correndo para os teus braços
Feito nuvem que ruma à frente do Sol.
Sou assim, de loucura e precipitação,
E quando eu chover terei cumprido
A missão de me desfazer sobre você
Tendo teus olhos limpos como mar por lar.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

POESIA - SILÊNCIOS COMPLETOS - THIAGO LUCARINI

Às vezes encontro dentro de mim
Silêncios salpicados de tristezas
Feitos de pequenez e grandezas
Que quase não consigo suportar.
São silêncios completos cheios de ecos
Onde minh’alma frágil recusa-se
A dar o convencimento da palavra
Tão gasta e esfarrapada pela língua.
São rios de águas espelhadas e lisas,
Porém de invisíveis e vis correntezas.
Cabem nos meus silêncios: defesas,
Alegrias inteiras e todo o brilho das estrelas.

POESIA - PALAVRAS NÃO CONVENCEM - THIAGO LUCARINI

Nada há de ser dito
Quando as palavras não convencem.
Assim, sem som são navios
Encalhados no profundo da alma,
São espinhos atravessados na goela.
Feitas de mudez e vícios do calar
Palavras não ditas são destinos sem ida,
São amores não alcançados,
Edificações não erguidas.
São duras paredes invisíveis
Entre o ato esperado e o nada basal.
Como distorções do pensamento
Reverberam feito fantasmas
E o eco assombroso de suas correntes.

POESIA - RAÍZES DE AR - THIAGO LUCARINI

Jáa não há pertencimento,
Vontade de ficar, permanecer,
Paredes para eu chamar de lar,
A ausência não tem cura
Apenas muda de nome.
Agora sou vento sem matéria
Disperso entre alegrias e lamentos
Pela rotação inconstante do coração.
Minhas raízes de ar estão fofas,
Desprendidas do solo duro
Qualquer hora dessas tantas
Tranço-as em asas e saio voando.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

POESIA - EU - THIAGO LUCARINI

Tenho sonhos quebrados
Em cacos de uma vida solitária,
Cacos pintados de cinza
Em leves tons de inexistir.
Gostaria de não ser escravo de mim,
Dos meus desejos, anseios e solidão
Queria ser rei do meu eu infinito
Deixar de ser insígnia do medo
Para ser brasão de coragem.
Arrombando definitivamente
Os grilhões do sistema
Viver sem amarras à falsa moral
Ou ao pudor tedioso.
Desejo apenas ser livre
Livre de tudo aquilo que me esconde,
E rouba-me de mim,
Para assim, valorizar diariamente
O todo indivisível chamado, eu.

POESIA - UM POUCO DE CERA - THIAGO LUCARINI


Amar é ter asas de um Ícaro ambicioso,
E, ainda assim, recear chegar tão perto do Sol,
Uma força que não é de todo sua, pois é maior. 
Sucumbirei aqui por: entrega ou loucura ou ambos? 
Sei que se eu cair, em queda agradecerei, por ter estado tão perto da Glória.
Um pouco de cera derretida sempre valerá alguma felicidade de grandeza. 

terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

POESIA - CAMPANÁRIO - THIAGO LUCARINI

Os sinos repicaram no alto da torre
Um arauto desconhecido sobre a cidade

O quê os sinos anunciavam ninguém sabia
Morte, vida, nada, o mesmo basal de sempre.

Todos saíram às ruas com o tilintar do campanário
Os pássaros saíram em revoada mesmo sendo crepúsculo

As folhas silenciaram seu ciciar na brisa morna
Os sapos calaram seu coaxar ritmado chamando as estrelas  

As flores abriram suas pétalas curiosas
As águas inverteram sua correnteza para passarem

Sob a ponte perto da igreja outra vez.
O sol estagnou sua descida no ocaso junto à lua em ascensão

Numa disputa, não chegou o fim do dia de fato
Nem se iniciou a noite, todos absolutamente todos

Queriam saber o que os sinos do campanário
Gritavam naquele tempo parado sem ser hora de missa

Ou mesmo hora fechada para tocarem os sinos
Nem filho de rei sequer havia para nascer.

Longe, o padre, de férias. Na Casa de Deus
Nenhuma vivalma estava ou habitava. Anjos?

Ninguém soube o porquê de os sinos reverberarem,
Um mistério eterno deste campanário estático.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

POESIA - INSISTÊNCIA - THIAGO LUCARINI

Não me renderei.
Não sucumbirei à tristeza de horas plenas
Nem me desfarei no vendaval pré-temporal.
Recuso-me a voltar a ser ruína,
Coroada caída, flor descolorida.
Refutarei as lágrimas insistentes
Que caem por desconhecer teu paradeiro
Resistirei do alto do meu pedestal silencioso.
Insisto em ser alegria apesar da tua indiferença,
Insisto em ser pedaço de sorriso, promessa de felicidade,
Insisto em estar de pé por mais que meus pés vacilem,
Insisto em ser luz por mais que a noite seja escura e vazia.

domingo, 11 de fevereiro de 2018

POESIA - IMAGÉTICO DAS ETERNIDADES - THIAGO LUCARINI

Há algumas eternidades, das quais,
Não devemos nunca falar

Deixar de lado estas horas líquidas passadas
Depostas pelos relógios e atiradas goela abaixo.

Há um botão de roupa perdido
Há um botão de rosa ferido
Há o meu coração partido. 

Coroas e corvos caem. Temporal de agulhas-ponteiros
É a todo instante vivente, crianças, anjos me rodeiam,

Gigantes demônios oníricos também. Sigo com um cristal
De gelo enigmático derretendo na boca ferida de aftas

E uma primavera mantida adormecida no coração.
E assim, as eternidades vão compondo a trama,

O fino tecido do drama de todas as palavras de horas inconfessas.
Paira sobre mim o halo da auréola nupcial de aleluias frescas e tontas

Saídas de depois de a chuva do imagético fim de tarde em colônia
Onde quem pousa no horizonte espelhado é a lua em crescente festim.

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

POESIA - ILUSÃO DE AÇO - THIAGO LUCARINI

Ás vezes depositamos o coração
Num lugar aonde não devíamos,
Construímos um altar de pura ilusão
Para decorar uma mentira interna
Que externa parte da fragilidade adquirida.
Toda cola usada, todo argamassa são mentira,
Falhas concretas de momentos de vida infeliz.
Cair do alto do altar é só uma questão de tempo,
Os sinos não irão badalar em anúncio, pois choram.
A ilusão não sustenta quereres de grata felicidade,
Ela pode até tentar se passar por resistente aço,
Mas no final do dia é sempre linha fina para fiasco
E o santíssimo em adoração é só um boneco de barro.

POESIA - ESCARRAS - THIAGO LUCARINI

Por tempo demais
Meu inábil coração
Permaneceu na mesma posição
Adquirindo severas escarras
Feridas abertas pelo tempo de desuso
E grande pressão das horas de solidão.
Cheio de dor e desconforto quase não batia,
Fraquinho apenas existia sem ser.
Machucado quis enfim remédio e bálsamo
Foi quando pelo milagre achei você. 

POESIA - MARCA SEM CICATRIZ - THIAGO LUCARINI

O objeto que te faz lembrar
É marca sem cicatriz
É dor sem ferida
É lembrança não pedida
É saudade comprada
É vínculo desmanchado
É lixo sem destino
É espelho sem reflexo
É âncora maldita
É amor partido
É o resto de nós desfeito.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

POESIA - OBSERVADOR DO AMBIENTE - THIAGO LUCARINI

A mercê dos olhos
A guilhotina do tempo,
Momentos de boa felicidade
Duram pouco apesar do espaço certo
Compreendido entre as mansas horas.
Estar contigo é como ser um peixe no aquário
Preso numa redoma de grata suspensão de tudo,
Cabe, ali, eu ser observador do ambiente, no qual,
Estamos inseridos e buscar pescar pequenas coisas,
Instantes de maior verdade e esperança de permanência.

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

POESIA - SEGREDOS SÓRDIDOS - THIAGO LUCARINI

Tenho que me controlar.
Seria muito fácil ceder ao impulso
De te tocar, beber do teu cheiro,
Arrepiar-me no teu hálito quente,
Provar o teu gosto desconhecido,
Derreter-me ao som da tua voz,
Romper com o teu sexo provocativo.
Fixo meu olhar na possibilidade
De me desfazer sobre tuas curvas,
De enfim, conhecer teus sabores
E segredos sórdidos, mistérios
Para serem tão somente nossos.
Tudo ainda é apenas devaneio,
Desejo e fogo que queimam em mim.
Mas espero solenemente confissão tua,
Comum acordo para sermos sol e lua
Nestes veios amassados de seivas doces
Sobre os pretensos lençóis da cama.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

POESIA - O MENINO QUE CHUTA A LATA - THIAGO LUCARINI

O menino segue a rua
Chutando uma lata velha
Que tilinta no asfalto.

O menino chuta a lata
Que vazia, quica, se amassa
E é chutada novamente

Deixando escapar seus sons
De bela agonia, depois de ter
Todo o seu conteúdo roubado.

Seu corpo oco é maltratado,
Abusado por um moleque qualquer
Num dia feliz e quente de verão.

O menino vira homem.
O homem segue a rua.
Antes nos vales da inocência, a lata,

Era apenas isso, uma lata, sem simbolismo.
Hoje, ele chuta o objeto descartado,
Porém a lata velha com o peso

Da vida cotidiana, sem a fantasia
E a doçura da infância, representa
Sua própria vida: sucata sendo chutada

Pelos seus pés calejados, fracos, fartos do caminho
Que não leva a lugar algum. O verão se foi e sua vida
Não é mais que um pobre objeto abusado e amassado.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

POESIA - A MARCHA DOS PONTEIROS - THIAGO LUCARINI

Os ponteiros marcham.
São soldados invencíveis e cruéis
Não há porque se deterem
Se o meu coração tombado
Do alto de o seu pedestal falso
Ficou ferido no meio do caminho
Não há tempo para recuperar o fôlego,
Curar as feridas, esperar benevolente bálsamo.
Não importam quantas feridas fiquem para trás
Rumam duros os ponteiros às horas infinitas
Seguem mesmo quando o relógio está sem pilhas,
Pois seus corpos são espadas afiadas e cheias de pressa.