quarta-feira, 30 de maio de 2018
POESIA - INCOMPETÊNCIA HUMANA - THIAGO LUCARINI
domingo, 27 de maio de 2018
POESIA - DANÇA NO ESCURO - THIAGO LUCARINI
segunda-feira, 21 de maio de 2018
POESIA - FLORES BRANCAS - THIAGO LUCARINI
domingo, 20 de maio de 2018
POESIA - A HISTÓRIA DOS LENÇÓIS - THIAGO LUCARINI
quinta-feira, 17 de maio de 2018
POESIA - MINERADO - THIAGO LUCARINI
quarta-feira, 16 de maio de 2018
POESIA - ÓCIO E AGONIA - THIAGO LUCARINI
sábado, 12 de maio de 2018
POESIA - CANÁRIO - THIAGO LUCARINI
quarta-feira, 9 de maio de 2018
POESIA - OLVIDA-TE ESQUECIMENTO - THIAGO LUCARINI
terça-feira, 8 de maio de 2018
POESIA - ENCAIXE - THIAGO LUCARINI
segunda-feira, 7 de maio de 2018
POESIA - DISTRAÍDOS DO MAL - THIAGO LUCARINI
sábado, 5 de maio de 2018
CRÔNICA - CADEIA ALIMENTAR - THIAGO LUCARINI
Estava eu com vontade de comer peixe. Cansado dos
mercados e seus frescos ou enlatados prontos
para consumo, fui a uma venda de peixes vivos. No tanque, escolhi do cativeiro
aquele que mais me agradou, o vendedor, um rapazote, o pegou com uma rede e
rapidamente lhe deu um golpe com uma ferramenta de claro uso em abate, da qual,
desconheço o nome. Naquele instante, pensei que meu jantar tinha ido por água
abaixo, pois um grande remorso me invadiu. De forma planejada, contribuí com a
morte de um ser. Silenciosos, peguei meu pacote e fui embora. O peixe nos seus
últimos suspiros pulava na sacola, movimentos involuntários de resistência,
porém não existia firme linha para se segurar, se livrar da panela. Meu coração
igualmente pulava, eu sabia da necessidade, um só haveria de viver.
Em casa, me
apressei a arrumá-lo, escamar, estripar e todo o restante do processo. Eu
sentia-me um pleno maníaco assassino com a mão num corpo de água tão frio. A
vida rápida e pronta do cotidiano dos açougues e ilhas de congelados nos
tiraram o horror da morte de outros seres com intuito de sobrevivência própria.
O peixe com seus espasmos involuntários insistia em algo que não tinha mais
volta, já estava morto, e contraditoriamente, o corpo recusava-se de algum
jeito a deixar a alma ir totalmente. Sem eu perceber, levei meu dedo à boca espasmódica
do falecido que muito do vingativo me mordeu. Quase xinguei, contudo, não o
fiz, pois sentia-me merecedor de tal punição do morto.
Em meio a dor e frustração, percebi o quanto sou grato
pelo tempo em que vivo. Deus me livre ser preciso eu matar uma vaca, um porco,
uma galinha, outro peixe. Estou seguro, uma
vez que não preciso sair à caça todos os dias, ter que matar consciente e
regularmente. Gosto da morte que não suja as minhas mãos, da ilusão dos pedaços
fatiados e pendurados em ganchos, que não confessam qualquer traço de vida
escondida ou preexistente. Já abatidos é mais fácil ignorar sua história, sua
dor, e isso, egoistamente, me basta, posto que asseguram a minha sensação de
inocência. Matar para comer é necessidade, mas ter essa experiência, assim,
nascida de um simples desejo para o jantar é amedrontador, é confirmar o que
sabemos desde sempre: a vida sustenta-se sobre os ossos dos mortos. É questão
de tempo até eu ser o abatido, ser comida da natureza. Parte do ciclo em contínuo
processo.
De volta ao conforto e comodidade, meus incapacitantes
naturais, olhei o peixe pronto na panela. Estava com uma cara maravilhosa. Se o
comi? Claro! Custou caro. Em mim não restava qualquer lembrança do prévio remorso.
Não há moralidade na fome. Acabou que o peixe rendeu não só um prato delicioso como
uma crônica de brinde.